terça-feira, 9 de julho de 2013

Rio in Douro

Partindo da constatação das inúmeras dificuldades sentidas pela grande maioria dos jovens diocesanos em poderem participar nas Jornadas Mundiais da Juventude – Rio 2013, a Pastoral Juvenil na Diocese do Porto (através do seu Secretariado Diocesano e diversos Movimentos Juvenis) propõe esta forma alternativa de “viver” e “celebrar” essas mesmas Jornadas na nossa cidade e neste “nosso” Rio.
Assim, o Rio in Douro pretende ser um “mega encontro” dos jovens da Diocese do Porto (e/ou de outras Dioceses que nos queiram fazer companhia), pertencentes quer às suas paróquias, quer aos movimentos juvenis nela presentes, nas suas mais pluriformes estruturas e concretizações, que queiram viver e experimentar, em clima de festa, de alegria, de oração e de partilha, o “espírito” das Jornadas Mundiais da Juventude.

Porque se trata de um “mega encontro” para o qual estamos a contar com a presença de milhares de jovens, o Comité partiu à descoberta de locais que pudessem acolher, nas melhores condições possíveis (de acessibilidade, centralidade, etc…) os participantes, tendo a escolha recaído sobre o Cabedelo da Foz do Douro (em Canidelo, Vila Nova de Gaia).
Trata-se de um local muito aprazível, com óptimos acessos (carro, comboio, autocarro, metro…) e muito conhecido da gente jovem, pois é também o espaço escolhido, nos últimos anos, para a realização de festivais de verão.

Do programa deste Rio in Douro fazem parte vários momentos que tentam, a seu modo e em conjunto, criar o ambiente vivido nas Jornadas Mundiais da Juventude.
A chegada dos participantes está prevista para o dia 27 de manhã, em quatro pontos diferentes, de onde partirão, em caminhada, para o recinto. Aí chegados e depois de serem devidamente acolhidos em ambiente de grande festa, haverá muito(s) tempo(s) e espaço(s), durante a tarde e noite de sábado e manhã de domingo, para vários workshops (formativos uns, lúdicos outros), momentos de oração (nos quais se incluem uma oração na praia, uma Vigília com ligação directa ao Rio de Janeiro e a Eucaristia de Encerramento/envio) concertos, catequeses com os Bispos, alimentação, etc., tudo isto num forte ambiente de festa, de convívio, de alegria e de fé.

quarta-feira, 3 de julho de 2013

"Segue-me"


"Gosto de lembrar que o primeiro nome dado aos discípulos de Jesus, segundo nos conta os Actos dos Apóstolos, foi: "os do Caminho". E só em Antioquia recebemos o nome de "cristãos". Aquele primeiro nome continua a evocar esta realidade de movimento e procura, de "andar com" Jesus e com outros, de seguir Alguém que se chamou a si mesmo "O caminho", que importa nunca perder na identidade cristã. Se o nosso povo diz, com sabedoria, que "parar é morrer", sabemos que todas as formas de instalar e acomodar a experiência cristã, de retirar às palavras de Jesus a sua força profética de transformação, de cristalizar o Reino de Deus em estruturas simplesmente humanas que nos "endeusam" em vez de servir o projecto de amor de Cristo, são claramente provisórias. A fé em Jesus Cristo é dinâmica, anda de mão dada com a esperança e oferece generosamente actos de amor.

Caminhar implica despojamento, escolha do essencial, uma meta e uma companhia. E ainda que a meta não se vislumbre completamente, é bom saber com quem vamos, porque o caminho até se torna menos árduo se o fazemos com outros. Na decisão de Jesus há uma continuidade e uma ruptura: Jerusalém era a cidade santa onde era sempre maravilhoso poder ir, mas é também a cidade que rejeitou os profetas e a novidade da mensagem de Jesus vai confrontar-se com a lei empedernida dos judeus. Por isso não basta querer seguir Jesus, como desejam os do evangelho de hoje. É preciso revestir-se das suas atitudes de humildade e coragem. É necessário não buscar seguranças a não ser a de anunciar o amor libertador de Deus, de não ficar preso aos laços que impedem de abraçar o horizonte maior do Reino, de não estar voltado para o passado mas olhar para o futuro que Jesus sempre nos propõe. Não é verdade que muitos futuros não se concretizam porque nos agarramos demasiado ao passado? E quantas pessoas encerramos em julgamentos porque deixamos de confiar na esperança? Que diremos a Jesus, para quem o futuro de cada pessoa vale mais que todo o passado, e sempre enche de esperança o vazio que o mal produz?

Seguir Jesus não é algo solitário. É a derrota do individualismo, que pode gerar alguns heróis mas não é capaz de fazer nenhum santo. Com Ele aprendemos que só somos uns com os outros. Jesus não quis ser sem nós, Ele que é "com o Pai e o Espírito". Seguimo-l'O em comunidade, na imensa e rica diversidade de laços de comunhão que podemos sempre a criar (e às vezes também quebramos, mas não podem, a qualquer momento, ser religados?). O importante é não nos acomodarmos, quase como dizia Fernando Pessoa "sem que um sonho no erguer de asa / Faça até mais rubra a brasa / Da lareira a abandonar". Não caiamos na tentação de adaptar o evangelho a uma vida "assim-assim", talvez uma "meia-vida", que nunca enche o coração nem realiza o que somos. Dizia o Papa Francisco no Pentescostes passado: "Muitas vezes seguimo-Lo e acolhemo-Lo, mas até um certo ponto; sentimos dificuldade em abandonar-nos a Ele com plena confiança, deixando que o Espírito Santo seja a alma, o guia da nossa vida, em todas as decisões; temos medo que Deus nos faça seguir novas estradas, faça sair do nosso horizonte frequentemente limitado, fechado, egoísta, para nos abrir aos seus horizontes"."

domingo, 9 de junho de 2013

Profetizar no Século XXI

1. Descobrir e propor o projeto de Deus para o mundo e para os homens. O profeta é homem do seu tempo, marcado pelas descobertas, conquistas, contradições e esperanças dos homens do seu tempo… É também alguém com uma fé profunda, com uma consciência muito forte da presença de Deus na própria vida. A vida de união e de comunhão com Deus vai impregnando a vida do profeta, de modo que vai aprendendo a interpretar todos os acontecimentos políticos, sociais e religiosos à luz de Deus e do seu projeto. Só deste modo ele pode apresentar o projeto de Deus para os homens hoje.

2. Sentir-se chamado por Deus, receber de Deus uma missão, ser enviado por Deus ao mundo. Deus chama de muitas formas… Um sonho, uma leitura, um acontecimento, um sinal… Às vezes descobre-se o seu apelo no rosto de um pobre ou de um escravizado; outras vezes, nas páginas dos jornais; outras, nas necessidades da Igreja ou da sociedade; outras, nos acontecimentos turbulentos do presente; outras, mais simplesmente, nas palavras de um amigo ou de um mestre… Ao ser chamado, o profeta recebe de Deus uma missão.

3. Estar marcado pelas experiências de solidão, angústia, sofrimento, crise, rejeição, incompreensão… Ser fiel à missão de Deus, mesmo quando, com essa atitude, o profeta se sente abandonado, rejeitado, incompreendido. No fundo, trata-se de arriscar a vida, na certeza da presença de Deus.

4. Estar desinstalado, num território concreto… como espaço de verificação e de rejeição da profecia anunciada. Ninguém é profeta na sua terra, é certo. Mas é na terra, no espaço concreto, na escola, no local de trabalho, na comunidade, na Igreja… que a profecia deve ser anunciada. Com coragem, com desassombro.

5. Viver no quotidiano da existência, na minha situação concreta, aqui e agora. Como ser profeta, aqui e agora, na minha situação, face aos problemas reais que me entram pelos olhos e interpelam o meu coração aberto ao Pai e ao próximo?

6. Anunciar as Boas Novas de sempre duma forma sempre nova. O conteúdo do anúncio profético é sempre o mesmo. Mas esta única Palavra de Deus deve ressoar duma forma sempre nova…

7. Assumir um modo novo e inédito de viver e anunciar o essencial. Anunciar um modo novo de viver o essencial. E o essencial é a fé, a esperança e a plenitude do amor, das quais os profetas foram testemunhas vulneráveis mas obstinados. O Espírito sopra onde quer e como quer, com liberdade imprevisível, não se deixando amarrar em esquemas exclusivos ou demasiado estreitos…

8. Escutar, aprender, receber, acolher… o Deus do povo e o povo de Deus.

9. Ser coerente entre a palavra anunciada e as opções pessoais. Quantos pretensos profetas gritam diante dos microfones, ditam sentenças nos jornais a torto e a direito, gesticulam nas praças e na televisão… mas não dão testemunho com a sua vida. Por isso, não mudam as coisas! Há incoerência entre pensamento e vida, entre ideal e prática.

10. Denunciar não apenas os pecados, mas as estruturas de pecado, promover e estimular novas estruturas de virtudes e valores.

11. Testemunhar entre o silêncio intenso-pleno e o silêncio despojado-vazio. Diante dos dramas recentes e atuais, diante das angústias e sofrimentos, diante dos vazios e da falta de esperança, o profeta dá testemunho, com o seu silêncio, do silêncio de Deus. Não é fácil, mas pode ser um silêncio fecundo que fala.

12. Lutar contra os novos ídolos de hoje: detetá-los, desmascará-los, denunciá-los…

13. Anunciar a fé e a justiça, assumir a esperança como raiz da profecia. Não se trata de duas coisas distintas: a fidelidade ao Deus vivo exige a defesa dos direitos do pobre. A mensagem profética, na sua capacidade de denúncia, integra-se e aperfeiçoa-se, especificando-se, na proposta de uma utopia, na “proposta de uma alternativa”, chamada esperança. Sem esperança não há profecia.

14. Viver pobre a profecia da gratuidade, da sobriedade, da essencialidade: sentir a alegria de dar, gratuitamente; experimentar a força do Amor criador de Deus; praticar diariamente uma vida simples, sóbria; ir profeticamente contra a corrente do domínio e do consumo; ser capaz de desmascarar as raízes do egoísmo e as suas consequências…

15. Viver obediente a profecia da multiculturalidade: descobrir a única vontade de Deus Pai; deixar os isolamentos, os nossos planos egoístas; procurar a vontade de Deus na vontade da comunidade; deixar de lado o escândalo da excomunhão mútua; comungar no mesmo Deus…

16. Viver casto a profecia da sexualidade redimida: testemunhar a redenção de Cristo na globalidade do nosso ser (inteligência, liberdade, fantasia, corpo, afetos, sentidos); ser profetas da libertação integral…

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Para ler o Concílio Vaticano II - parte 3

Constituição Dei Verbum

O interesse pelos temas ligados à Sagrada Escritura era muito forte na época do Concílio Vaticano II. A Constituição Dei Verbum (A Palavra de Deus - DV) é fruto de um caminho de amadurecimento que levou anos, sofrendo grande influência das Encíclicas Providentissimus Deus, de Leão XIII; Spiritus Paraclitus, de Bento XV, e Divino Afflante Spiritu, de Pio XII. Um aprofundamento lento, mas que reflectia uma necessidade da Igreja: dar o devido valor à Sagrada Escritura. Por ocasião do Concílio, chegaram a Roma 102 proposições que foram seleccionadas, agrupadas e aprofundadas pela comissão preparatória. O texto actual foi promulgado em 18 de Novembro de 1965, após receber 2.344 votos a favor e 6 contra.
O maior objectivo do Concílio era difundir a Palavra de Deus, em cumprimento do desejo de Jesus Cristo, que anunciou: "Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Notícia a toda a Humanidade" (Me 16,15). Logo no Proêmio destaca-se o objectivo de "propor a genuína doutrina sobre a Revelação divina e a sua transmissão, para que o mundo inteiro, ouvindo, acredite na mensagem da salvação, acreditando, espere e, esperando, ame" (DV, n. 1).
A estrutura do documento é bastante simples, mas concentra um ensinamento muito belo e profundo. O capítulo I é sobre a Revelação e descreve o processo contínuo de comunicação entre Deus e o ser humano. Revelar é uma palavra que deriva do latim revelare e significa tirar o véu, divulgar, mostrar, dar-se a conhecer. São muitos os sinónimos, mas a ideia central é exactamente esta: manifestar. Deus revelou-Se, deu-Se a conhecer aos nossos antepassados, manifestou a Sua vontade e a Sua verdade diversas vezes ao longo da história, com o objectivo de conduzir todos à comunhão consigo. Na plenitude dos tempos, revelou-se de modo pleno e definitivo através do seu Filho, Jesus Cristo, o Verbo Encarnado. Em poucas linhas, a Dei Verbum concentra os fundamentos de toda a Teologia da Revelação. O seu conteúdo é bastante profundo e, por isso, ainda há muito a ser aplicado. Não é por acaso que a última encíclica de Bento XVI, sobre a Palavra de Deus, se chama Verbum Domini, numa clara referência e continuidade ao documento conciliar.
O capítulo II ocupa-se da transmissão da Revelação divina. Confirma que o nosso acesso à Revelação acontece através da pregação dos apóstolos e dos seus sucessores. É a chamada Tradição, que se origina nos apóstolos e progride na Igreja sob a inspiração do Espírito Santo (DV, n. 8). A Tradição ajuda a compreender a Escritura, pois as duas estão intimamente relacionadas, são dois pilares da fé cristã, provêm de Deus e tendem ao mesmo fim: conduzir o ser humano a Deus.
A seguir, o documento confirma que a Sagrada Escritura foi escrita por mãos humanas, mas sob inspiração do Espírito Santo. Para a interpretação da Bíblia é preciso ter em conta a sua inspiração divina, os géneros literários, os estudos exegéticos e hermenêuticos, e tudo o mais que possa contribuir para um aprofundamento e melhor compreensão do texto. Incentivam-se assim as pesquisas e estudos bíblicos, primeiramente por parte dos pastores e pregadores, mas também de todos os cristãos, pois não é possível amar o que não se conhece. Como bem destacou frei Herculano Alves: não é possível viver o Cristianismo sem conhecer o Livro onde está escrito o que é ser cristão. [...] A Bíblia nunca entrará realmente na vida dos cristãos, em particular, e na vida da Igreja, em geral, sem que a conheçamos previamente.
Os capítulos IV e V tratam, respectivamente, do Antigo e do Novo Testamento. O Antigo Testamento contém um retrato da história da salvação e serviu para preparar o advento de Cristo, que veio instaurar o Reino, como é descrito no Novo Testamento.
Por fim, vemos como a Sagrada Escritura age na vida da Igreja (capítulo VI). Ali vemos muito explícito o convite ao aprofundamento da Palavra de Deus através da tradução da Bíblia para todas as línguas, além do estudo e da investigação. A Escritura deve ser a alma da Teologia (DV, n. 24). De fato, a partir do Concílio, a linguagem bíblica generalizou-se no campo teológico e pastoral. Foi uma das revoluções provocadas pelo Concílio na Teologia e na vida da Igreja. A Constituição Dei Verbum deu origem a muitos outros bons frutos, tais como a renovação bíblica em âmbito litúrgico, teológico e catequético; a leitura e aprofundamento da Bíblia através do apostolado bíblico, com o aparecimento de diversos grupos, movimentos e iniciativas; a divulgação da lectio divina; a animação bíblica da pastoral.
Há, porém, muito ainda por fazer. Muitos cristãos estão distantes da Bíblia, ignorando os seus ensinamentos e verdades. Muitos também fazem uma leitura fundamentalista ou superficial que induz ao uso erróneo do seu ensinamento. Enfim, muitos ainda não foram iluminados pela Palavra de Deus, que é "lâmpada para os meus pés e luz para o meu caminho" (SI 119 [118], 105). O apelo do Concílio é fazer conhecer sempre mais e melhor a Palavra de Deus e que "encha cada vez mais os corações dos homens o tesouro da Revelação, confiado à Igreja" (DV, n. 26).
Esse apelo é tão actual que o último sínodo dos bispos, realizado de 5 a 26 de Outubro de 2008, falou exactamente sobre "a Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja". No documento preparatório do sínodo, o secretário-geral, Nikola Eterovi, enfatizou a ainda actual necessidade de conhecer integralmente a fé da Igreja sobre a Palavra de Deus, de alargar com métodos adequados o encontro com a Sagrada Escritura por parte de todos os cristãos e, ao mesmo tempo, acolher os novos caminhos que o Espírito hoje sugere, para que a Palavra de Deus, nas suas várias manifestações, seja conhecida, ouvida, amada, aprofundada e vivida na Igreja, e assim se torne Palavra de verdade e de amor para todos os homens.
O sínodo trabalhou a relação entre Revelação, Palavra de Deus e Igreja, numa clara referência e actualização da Dei Verbum. Juntando a releitura do documento conciliar com as actualizadas reflexões do sínodo, expressas na Encíclica Verbum Domini, de Bento XVI, temos um grande incentivo para aprofundarmos a leitura da Bíblia através do estudo individual, da participação em cursos de formação e escolas bíblicas, da catequese, da busca de material de apoio e, claro, da oração diária, especialmente a lectio divina. Oxalá ouvíssemos na nossa comunidade as palavras dirigidas por Paulo aos Tessalonicenses: "Irmãos, rezai por nós, a fim de que a palavra do Senhor se espalhe rapidamente e seja bem recebida, como acontece entre vós" (2Ts 3,1).

 

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Carta ao evangelista da misericórdia


 Caríssimo Lucas

Saúdo-te como saudaste Teófilo, o destinatário do Evangelho e dos Actos que escreveste. Seria um verdadeiro “amigo de Deus”, de carne e osso, e teu amigo também, ou pensavas já em nós que, ao longo dos tempos, iríamos saborear a obra que nos deixaste? E que muitos, como eu próprio, iríamos começar a conhecer Jesus pela leitura do teu evangelho?  O certo é que o teu olhar sobre Jesus Salvador, com a particular predilecção pelos mais pequeninos, a sensibilidade aos pormenores, a insistência na misericórdia de Deus que Jesus oferece, o lugar das mulheres e dos estrangeiros, as narrações tão vivas da infância de Jesus e o lugar materno de Maria são alguns aspectos que te caracterizam. E que alegria escrever-te neste Dia que dedicamos às mães!
Santo Ireneu e outros Padres da Igreja afirmam que eras médico (a atenção com que narras como Jesus suou sangue na agonia, parece revelá-lo). São Paulo apresenta-te como um companheiro da sua missão e fala de ti em três cartas. Apetece tanto perguntar-te: Escutaste os relatos da infância de Jesus pela voz de Maria, sua mãe? Como foste sensível às parábolas que só tu contas: o bom samaritano, o filho pródigo, o fariseu e o publicano? E como dizer-te o encanto de ouvir o relato dos discípulos de Emaús? Talvez as tuas raízes interiores de cuidar e curar as pessoas tenham marcado a sensibilidade aos gestos de cura e salvação que Jesus realizou e às palavras de libertação e de misericórdia que enchiam de alegria os mais sofredores e abandonados. Essa presença da misericórdia de Deus em Jesus e o seu desejo que os discípulos a aprendessem e transmitissem é uma constante quando lemos o teu evangelho. Uma misericórdia que é universal, que se dirige a todos (por isso deves ter gostado tanto de andar com São Paulo a levar Jesus para lá das fronteiras do Judaísmo), e que transforma a vida daqueles que acolhem Jesus.      
Queria agradecer-te também por nos teres escrito os Actos dos Apóstolos. E por não lhe teres posto um final pois, como certamente já acreditavas, este é o livro que os cristãos continuamos a escrever. Um livro de páginas luminosas e outras bem esborratadas, mas um livro que continua a ser obra nossa e do Espírito Santo, em que aprendemos tanto sempre que o escutamos, mas também o enriquecemos com os mil e um modos de reconhecer e testemunhar Jesus vivo no mundo. A Igreja como obra em construção compromete-nos a viver mais profundamente a nossa fé e a darmo-nos em caridade. Não há falta de trabalho nesta empresa e todos são importantes e únicos. Neste domingo em que escutamos as sábias decisões daquele encontro em Jerusalém, a que convencionámos chamar primeiro Concílio, percebemos a pedagogia do Espírito Santo que nos convida à escuta mútua e a abrirmo-nos aos seus apelos. Quantas vezes deixamos de O ouvir, simplesmente porque não dialogamos bem, nem procuramos em conjunto!     
A tradição fez de ti o patrono dos médicos e dos artistas (talvez por ser-te atribuída a pintura de um ícone de Nossa Senhora com o Menino) e és representado com um livro na mão e um boi aos pés, que alguns interpretam como símbolo da fidelidade e do sacerdócio de Jesus, bem como do teu desejo de fidelidade na narração dos acontecimentos evangélicos. E pouco sabemos do final da tua vida. Mas o tesouro dos escritos que nos deixaste aproxima-nos todos os dias de Jesus e do seu projecto de amor. E reanima o desejo de sermos misericordiosos como Ele e como o Pai!


Obrigado São Lucas!


sábado, 4 de maio de 2013

Para ler o Concílio Vaticano II - parte 2

Constituição Lumen Gentium

Este documento envolve toda a Igreja na sua estrutura e na sua actividade. O primeiro capítulo fala do mistério da Igreja que “é, no Cristo, como que o Sacramento, ou seja, o sinal e o meio da união íntima com Deus e da unidade de todo o género humano” (n.1, e descreve a relação da Igreja de Deus, Pai, Filho e Espírito Santo).
O segundo capítulo apresenta a Igreja como Povo de Deus, constituído pelo Baptismo e do qual a cabeça é Cristo, a caminho através da história e destinado a reunir todos os homens. Lembra os laços entre a Igreja e os Cristãos não católicos, seus relacionamentos com os não-cristãos e afirma o carácter missionário do Povo de Deus. Apresenta em seguida os membros do Povo de Deus: a hierarquia (bispos, sacerdotes e diáconos) e os leigos.
O terceiro, sobre a hierarquia, afirma a colegialidade do episcopado (os bispos sucessores dos apóstolos, ao redor do Papa sucessor de Pedro, seu chefe, receberam de Cristo a responsabilidade da Igreja universal) e decide que os Episcopados locais podem restaurar o diaconado como uma Ordem permanente, e conferir esta Ordem a homens casados.
O capítulo quarto, sobre os leigos, mostra-lhes a participação na vida e na missão da Igreja (culto, proclamação do Evangelho, orientação para o Cristo da vida e das actividades de toda a humanidade).
O quinto capítulo fala da vocação à santidade por parte de todos os membros do Povo de Deus.
O capítulo sexto, sobre os religiosos, explica a função da vida religiosa em relação à vida espiritual de todo o povo cristão.
O sétimo capítulo apresenta a Igreja, peregrina na terra, para a vida eterna, em comunhão com a Igreja celeste.
Finalmente o capítulo oitavo apresenta a função materna da Virgem Maria no mistério de Cristo e da Igreja. Está em sintonia com este texto que Paulo VI, no dia 21 de Novembro de 1954, deu à Virgem o título de Mãe da Igreja, porque ela, enquanto mãe de Cristo, é também mãe de todo o Povo de Deus, seja dos fiéis como dos pastores.
Ao documento foi adicionado por vontade explícita de Paulo VI, uma "Nota Explicativa Prévia", contendo alguns fundamentos sobre o texto para evitar interpretações erradas. Esta Nota deve ser considerada parte integral do mesmo Documento.

sábado, 27 de abril de 2013

Para Ler o Concílio Vaticano II - parte 1

Constituição Sacrosanctum Concilium

A Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium sobre a Sagrada Liturgia foi o primeiro documento aprovado pelo Concílio Vaticano II. Este documento tem como objectivo a adaptação da Liturgia, levando a Igreja Católica a uma grande renovação litúrgica. Ela destaca-se por vários aspectos como: a reorganização e implicação da Eucaristia (Missa) no Rito Romano; o uso predominante da língua vernacular nas celebrações litúrgicas; a mudança na posição do sacerdote em relação ao altar (depois do Concílio, os padres passaram a celebrar a Eucaristia de frente para as pessoas). Todas essas mudanças promoveram maior participação da assembleia na Missa.
O Sagrado Concílio declara que a Santa Igreja tem a tradição de guardar aos fieis a sã Tradição. Cristo está presente no sacrifício da Eucaristia sob as espécies eucarísticas e na pessoa do ministro que se oferece agora pelo ministério sacerdotal, Ele é o mesmo que Se ofereceu na Cruz. Está presente com o Seu dinamismo nos Sacramentos, de modo que, quando alguém baptiza, é o próprio Cristo quem baptiza. Ele está presente na Sua Palavra, pois é Ele mesmo quem fala. “Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles”.
Todos os que crêem têm o dever de pregar constantemente a fé, a reflexão, e dispô-lo aos Sacramentos. O cristão tem o dever de mostrar a luz para o mundo e glorificar o Pai diante dos homens. Através da Liturgia a Eucaristia se faz alimento especial para nós como fonte de graça. Por meio dela, os fieis têm a eficácia da santificação em Cristo e a glorificação de Deus. A eficácia da Eucaristia é plena, é necessário que os fieis celebrem a Liturgia com rectidão de espírito, onde as palavras e a sua mente se pronunciam para a cooperação da graça de Deus, e que não aconteça de os fieis receberem a Eucaristia em vão.
O cristão é chamado a rezar em comum na participação na Sagrada Liturgia, por esta razão que no Sacrifício da Eucaristia pedimos ao Senhor que, tendo aceite a oblação da vítima espiritual, faça de nós uma oferta eterna a Si consagrada.

domingo, 14 de abril de 2013

Carta a Simão Pedro


Carta a Simão Pedro

Caríssimo Simão Pedro

Perdoa-me esta franqueza de me dirigir a ti, o príncipe dos Apóstolos, como se fôssemos amigos de longa data. Mas eu, pelo menos, sinto-me assim, porque desde o meu grupo de jovens, em que Jesus e os seus amigos se tornaram vivos e presentes, tu sempre me encantaste. E quando te vejo nas imagens das nossas igrejas gosto de te imaginar com um olhar mais vivo e um entusiasmo mais apaixonado.

Vim para o pé do mar, aqui em Carcavelos, que é bem mais agitado do que o teu querido Mar da Galileia. Onde primeiro Jesus te cativou e depois te confirmou. Percebeste que Jesus sabia mais de pesca do que tu, e daquela pesca que se chama salvação, libertação do mal para que os homens sejam felizes. Também tu foste pescado e as tuas respostas de amor curaram os "nãos" das trevas da paixão. Ah!, se aprendêssemos contigo a dar mais importância ao amor do que às faltas, e a acreditar que o amor salva enquanto a condenação mata!

Somos tão parecidos contigo. Convencidos das próprias forças e ousados nas certezas, mas depois, frágeis e incoerentes na hora da verdade. Gosto da primeira resposta que deste a Jesus: "andámos a pescar toda a noite e não apanhámos nada, mas porque o dizes lançarei as redes!". É preciso humildade para saber tanto de pesca e ainda assim abrir a mente e o coração a um conhecimento maior. Diante da abundância de peixes revelaste essa humildade: "afasta-te de mim, Senhor, que sou pecador." Começavas a descobrir que o amor de Deus é infinitamente maior que os nossos pecados. E como é triste quem ainda julga e propaga o contrário.

Às vezes sinto inveja de teres estado tão perto de Jesus. A recebê-l'O em tua casa, a subir ao Tabor, a responder a muitas das suas perguntas, a ir ao seu encontro caminhando sobre as águas, a viver as suas alegrias e as suas dores. Essa foi e será sempre a melhor escola para ser cristão: andar com Jesus. E porque Jesus nunca anda sozinho, andar com os outros! Imagino que não terão sido fáceis os primeiros tempos da igreja a crescer. Quantas vezes terás sentido que era uma obra grande demais para um pescador da Galileia? E como gerir as tensões e as diferenças dentro das comunidades? Foi grande a tentação de ficar seguros no ritualismo judaico, não foi? E como integrar aquela universalidade que Paulo de Tarso difundia e fazia tantos abraçar Jesus como Salvador? Fidelidade à tradição mas, sobretudo, coragem para acolher a novidade do Espírito Santo devem ter enchido a tua vida! E deste-a também por Jesus, como Ele te tinha dito junto ao lago.

Todos temos muito a aprender contigo. Mas nestes primeiros dias do Papa Francisco, quero muito pedir-te que o acompanhes e inspires. Que ele possa ser autêntico e corajoso a propôr-nos a vida com Cristo. Que ele encontre as melhores ajudas no serviço curial que tens visto crescer na tua Roma, (alguma vez imaginaste Sagradas Congregações ou Tribunais Eclesiásticos?)  Que possa promover a escuta mútua e o diálogo, a corresponsabilidade, a alegria de servir, o gosto de perdoar, a coragem de amar. Que não se sinta sozinho nem deixe que o enredem em tradições "douradas" mas nada evangélicas. Ajuda-o a não "romanizar" a Igreja, que vive e cresce em tantos lugares onde o Espírito Santo continua a levar Jesus ao coração de todos, pois a unidade é a comunhão nas diferenças. Sei que posso contar contigo.

Querido Simão Pedro, dá um grande abraço a Jesus, e a todos do céu que conheço e tanto amo. Obrigado pelo teu tempo!

domingo, 3 de março de 2013

"vou cavar-lhe em volta e deitar-lhe adubo"

Porque o nosso encontro de ontem (3 de Março de 2013) não pode ser esquecido... sobretudo... a Palavra não pode ser esquecida e tudo que ela recria em nós! O nosso Deus é paciente, espera, mas é exigente.... daqui a um ano vem colher os frutos!:)